FÉDON. Prt I - "Exercita-te na música"

Nos meus estudos filosóficos, um dos diálogos do Platão que mais me chama a atenção, sem dúvida alguma esse é o Fédon. Trata-se de um diálogo em que uma grande persona chamada Sócrates está à beira de sua morte física, discursando sobre o destino de sua alma ao ir para o Hades, devemo-nos recordar que, para os gregos antigos a concepção de inferno e céu é completamente diferente a que temos nos dias atuais e pelas próprias construções do assunto, dentro do viés cristão ou de outras religiões.

Todas as almas iriam parar no Hades, mas até mesmo essa concepção grega tinha as suas preocupações com as ações dos homens maus e dos homens bons, pois é exatamente do que se trata esse diálogo, posto que Sócrates diante de seus amigos, discorre para que parte do Hades sua alma pararia, ou se realmente ela fosse parar no Hades ou se simplesmente se perdesse na imensidão da região do submundo. Fédon é um desses amigos de Sócrates, e que esteve ao seu lado durante do o discursar daquele homem que por toda a Athena era considerado o homem mais sábio, mas ora; então como o homem mais sábio pode ter um fim tão atrozmente trágico ao receber a sentença da cicuta? E por que seus amigos não se manifestaram por essa sentença tão injusta?

É o próprio Fédon que nos conta essa história e ele mesmo, narra esse triste episódio da História da Filosofia ao encontrar-se com Equécrates e esse pede-o que conte de melhor forma possível o último dia do brilhante filósofo ateniense. Não vou me deter aqui na exímia ilustração dos fatos ocasionais desse diálogo, mas dos fatores importantes que pude retirar dele, fatores que se conciliam com as vivencias da atualidade, por essa razão eu afirmo que essa análise é de caráter geral.

Um ponto que acredito ser interessante analisar é, como Sócrates aborda a questão da importância da alma e é claro, o cuidado que devemos ter com a conduta que levamos em nossa vida. Certamente, esse será o fio condutor de nossa análise aqui, pois é sabido que Sócrates é um filósofo que se preocupa com a conduta de seus compatriotas atenienses, nos diálogos platônicos essa característica preocupação é latente aos olhos de quem já leu ou pretenderá ler algum dos seus diálogos.

Quando os amigos do Sócrates pedem a ele que fale do destino das almas dos homens, ele deixa claro que não é acometido pelo sofrimento fugaz por assim dizer. Não obstante, deixa claro que, nós somos acometidos pela dor e pelo prazer e que um sobrevém do outro, e que separados não dão a verdadeira harmonia da vida. Partindo disso, analisemos uma coisa que é muito comum a nós, que é justamente essa harmonia, tal qual Heráclito já nos assegurou que o mundo, junto com seu devir (movimento), é repleto do conflito dos opostos, como o seco e o úmido, o alto e o baixo, o frio e o quente, logo, a natureza já nos mostra que a harmonia encontra-se nesse movimento harmônico conflitante.

Porém, você pode estar se perguntando...
O que o diálogo Fédon tem a ver comigo?
O que essa análise pode fazer minha perspectiva de vida mudar?
Deveras, talvez em nada...
Talvez mude alguns pontos...
Talvez até te dê um novo olhar pela perspectiva da própria vida.

Como disse, esse é um dos diálogos de Platão que muito me impressiona, pois trabalha a questão da brevidade da vida, como também sobre a conduta que levamos. E não digo em relação somente a conduta moral ou ética, mas com a conduta que temos com o nosso próprio interior. O filósofo Bergson em sua obra energia espiritual, afirma que nós seres humanos não temos dores somente no corpo, mas também sofremos de dores na alma, porém não podemos quantificar as dores ou sofrimentos da mesma. O homem sofre de problemas psicológicos que estão diretamente ligados com questões do interior humano, o conceito de bem-estar, não é só com o cuidado do corpo, mas consequentemente da alma.

“corpo são mente sã”

Os gregos tinham esse imenso cuidado.
A dor e o prazer é algo presente de forma construtiva e benéfica, os estoicos e os epicurista buscavam trabalhar de forma harmoniosa esses dois opostos, contudo, há aqueles que fazem de ambos conceitos um caminho, penoso ou temerário. Penoso; quando colocamos os nossos sofrimentos em um pedestal e cremos não haver mais nada além do sofrer. Temerário; quando acreditemos que a felicidade terrena é inabalável, esquecemos que o sofrer constrói ainda mais o caráter.

Não estou desejando desprazeres ou desventuras para ninguém, mas apenas afirmando sobre aquilo que já fora afirmado aqui, a respeito da harmonia que existe entre ambos conceitos. Visto que no próprio diálogo Sócrates coloca ambos como movimento harmônico.

Diria que deus, sendo sua vontade reconciliar esses dois inimigos e não conseguindo, amarrou-os pelas cabeças, de forma que, a partir de então, quando um chega, o outro o acompanha. É o que estou sentindo agora, pois à dor que as correntes causavam a esta perna sobreveio o prazer. (Fédon, p.120)

O prazer a qual se refere é da companhia de seus convivas, logo, ele cuida do seu interior diante da dor do cárcere, da privação dos seus filhos e esposa, pela presença dos seus amigos. Como disse anteriormente, o homem sofre hoje de males que é mais oriundo das angustias da alma (mente) do que do corpo, basta analisarmos o alto crescimento de transtornos psicológicos, onde muitas vezes o corpo está excelentemente são, mas e a mente, a alma?

Recentemente na CNN Brasil, foi divulgado um aumento de casos de depressão e ansiedade, os casos de depressão tiveram um aumento de 4,2% para 8,0% e os casos de ansiedade subiram de 8,7% para 14,9%, é claro que existem inúmeros fatores para esses casos, mas trago esses dados para termos uma pequena noção de como o homem está cada dia mais interiormente doente. Não obstante, isso nos acrescenta ainda com mais propriedade para entendermos o objetivo de Sócrates para com seus amigos, ou seja, de dar o valor não só as condutas morais, mas também as condutas e cuidados interiores, pois as dores da alma não podem ser quantificadas, ninguém pode ir ao psicólogo e dizer “minha ansiedade é tão alta quanto a Rio-Star” ou ainda “minha depressão é tão profunda quanto as fossas marianas”

O Sócrates mesmo tinha um constante sonho, ele sonhava com o deus Apolo, que lhe pedia constantemente “Sócrates, exercita-te na música”, para ele era um simples pedido do deus para que ele continuasse com o ofício filosófico, mas com o passar do tempo entende que era um pedido de cuidado para com a arte do belo, da harmonia sonoras, das realidades intangíveis aos olhos humanos, das preocupações da alma.

Logo, o Sócrates aprende com isso sua primeira lição, que dentro do conflito entre a dor e o prazer há uma harmonia, e nessa harmonia, entende tão bem que o cuidado do corpo é tão importante quanto o cuidado da alma. É exatamente isso que proponho nessa primeira análise do diálogo Fédon, aqui fica o convite a você, caro leitor(a), pelas palavras de Apolo para o Sócrates, digo-vos “exercita-te na música”.

Fonte CNN-Brasil: https://www.cnnbrasil.com.br/saude/2020/05/09/estudo-indica-aumento-em-casos-de-depressao-durante-isolamento-social

Autor: Prof. Rodrigo Machado

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